Há princípio para tirar toda e qualquer confusão a respeito do assunto, damos destaque para as conseqüências que a morte gera:
Pode-se dizer que a morte gera dois efeitos distintos:
1) pelo Direito de Família, extingue o casamento. Por isso, cessa o regime de bens entre os cônjuges, cuja meação do patrimônio comum seguirá as regras do regime de bens;
2) pelo Direito das Sucessões, o patrimônio do falecido, agora herança, será imediatamente transmitida a seus herdeiros e legatários (droit de saisine).
O Código inovou no art. 1.845, e classificou o cônjuge como herdeiro necessário, assim como os descendentes e ascendentes.
Isto significa que, não podem ser privados do patrimônio hereditário por ato de última vontade do falecido. A eles a lei reserva uma parte certa da herança, que corresponde a metade dos bens da herança art. 1.846, ou seja, em testamento só poderá o testador desfazer de seus bens até o limite em que não entre na esfera de bens reservados aos herdeiros necessários.
Prevê o artigo 1829 e incisos que:
Art. 1829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
O cônjuge sobrevivente terá direitos sobre a herança se for casado sob o regime de separação de bens convencional, de comunhão final de aqüestos e no regime de comunhão parcial de bens se o(a) falecido(a) tiver deixado bens próprios. Neste último regime, se houver deixado somente bens comuns, não concorre.
A redação do inciso I, artigo 1.829 do C.C., confunde os princípios meação e herança e vincula o direito de herança do cônjuge sobrevivente ao regime de casamento existente à data da morte, sendo uma incoerência, já que meação e herança são institutos diversos, como acima exemplificados, uma pertence ao Direito de Família enquanto a outra ao Direito de Sucessões.
A técnica utilizada pelo legislador no inciso I não parece a melhor, levando em consideração que no inciso II o cônjuge vai concorrer com os ascendentes (pais, avós, etc.) independentemente do regime de bens adotado no casamento.
A interpretação gramatical levada a efeito pela leitura do caput do art. 1.829, combinada com o inciso I, é a seguinte: “os descendentes herdarão em concorrência com o cônjuge sobrevivente, a totalidade da herança do de cujus, exceto nas seguintes hipóteses:
1) se o falecido era casado sob o regime da comunhão universal;
2) se casado o de cujus sob o regime da separação obrigatória de bens;
3) se casado sob o regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares."
Nas hipóteses 1 e 2 supra citadas, seria fácil justificar a opção do legislador, pois:
1) - no regime da comunhão total, salvo algumas poucas exceções, comunicam-se os bens adquiridos antes e durante o casamento. Então, a (o) sobrevivente não ficará desprotegida (o), pois tocará em forma de meação, todo o patrimônio constituídos dos bens próprios e comuns.
2) - no regime da separação obrigatória, o que se quer, exatamente, é impedir que um dos cônjuges se beneficie do patrimônio do outro, por isso a sua exclusão, na herança, se justifica.
Entretanto, tormentoso é enfrentar a questão prevista no inciso I do artigo 1829, que diz:
"Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - (...) salvo se (...); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;"
Pela interpretação gramatical, o que se afirmou é que: “o cônjuge sobrevivente, casado sob o regime da comunhão parcial de bens, herdará em concorrência com os descendentes, a herança, desde que o falecido tenha deixado bens particulares”.
Assim em uma interpretação a contrário sensu, se o conjunto de bens for constituído apenas de bens comuns, considerando o regime de bens, o cônjuge supérstite não concorrerá com os descendentes.
Cumprido o requisito da Lei, ou seja, ter deixado o de cujus bens próprios, surge outra questão a ser enfrentada pelo aplicador da Lei. Qual seja: o cônjuge supérstite casado pelo regime de comunhão parcial de bens concorrerá apenas no que se refere aos bens particulares ou sobre a totalidade, considerando os bens próprios e a meação deixados pelo de cujus?
Duas correntes tentam exemplificar a questão:
A primeira corrente defende que: cumprido o requisito da Lei, ou seja, ter deixado o de cujus bens particulares no regime de comunhão parcial de bens, o cônjuge supérstite é chamado para concorrer com os descendentes, apenas na parte que diz respeito a estes bens próprios, a meação deixada pelo de cujus fica estritamente para os descendentes, sem a concorrência do cônjuge supérstite.
A segunda corrente defende que: – a lei estabeleceu como condição para concorrer com os demais herdeiros a existência de bens próprios, mas não excluiu a parte comum, logo, tem o cônjuge supérstite, direito a concorrer a todo o patrimônio deixado pelo de cujus.
A segunda corrente prega que tudo deixado pelo de cujus constituirá herança, não fazendo distinção, nesse montante, se são bens particulares ou não.
Esclarecendo melhor: retirada a meação do cônjuge supérstite, todo o resto constitui a herança deixada pelo falecido e, portanto, esta universalidade de bens é que deve ser dada à sucessão legítima da qual participa o cônjuge, concorrendo com os descendentes.
Observe-se, portanto, que por ocasião da morte de um dos cônjuges é forçoso, em primeiro lugar, realizar a meação do patrimônio comum ao casal porque a morte extingue a sociedade conjugal.
Saliente-se por fim que o art. 1.829, I, omitiu como será a sucessão do cônjuge se o regime de bens for o da participação final nos aqüestos (art. 1.672). Como o caput do artigo refere-se à sucessão legítima e exclui apenas as três situações do art. 1.829, I, parece que a melhor interpretação é atribuir a condição de herdeiro àquele casado sob esse regime, além do cônjuge ser herdeiro necessário.
O inciso III do artigo em estudo dá ao cônjuge viúvo a totalidade da herança do de cujus, também sem qualquer limitação quanto ao regime de bens, já que não há outros herdeiros necessários (descendentes, nem ascendentes).
Ainda é preciso lembrar que: para o cônjuge sobrevivente concorrer ou herdar sozinho, é necessário, além da hipótese do art. 1.829, que não esteja separado judicialmente, nem de fato por mais de 2 anos, por sua culpa, como preceitua o art. 1.830.
Os colaterais do falecido (irmãos, sobrinhos ou tios) herdarão apenas se não houver cônjuge ou testamento, já que não são herdeiros necessários.
Dr. José Carlos F. A. Júnior.
OAB/SP 251.048.
Dr. Fabio Gifoni Rocha.
OAB/SP 231.913